Opções alternativas de financiamento

O Decreto-Lei nº 26/2015, de 06.02 (em vigor desde 02.03.2015) alterou regimes das acções preferenciais e das obrigações previstos no Código das Sociedades Comerciais (CSC).

1. Introdução

As alterações aprovadas visam promover alternativas ao financiamento bancário, alargando as opções de financiamento através de instrumentos híbridos de capital (acções preferenciais) e revendo regras aplicáveis à emissão de obrigações, com destaque para as respeitantes aos limites de emissão e respectivas excepções. Resumem-se, em seguida, as principais alterações.

3. Obrigações

a) Limite de emissão (art. 349.º CSC) e excepções: limite deixa de ser o dobro dos capitais próprios, passando apenas a exigir-se que a sociedade apresente, após a emissão, rácio de autonomia financeira (capitais próprios / activos líquidos) igual ou superior a 35%, tendo por base de cálculo um dos seguintes critérios: i) o balanço do último exercício, desde que encerrado nos últimos 6 meses anteriores à data da emissão de obrigações; ii) um balanço especial, reportado à data que não anteceda o trimestre anterior à data de emissão de obrigações, ou iii) o balanço do primeiro semestre do exercício em curso à data da emissão de obrigações, caso a sociedade esteja obrigada a divulgar contas semestrais (aplicando-se mais que um dos critérios, considera-se o mais recente). O cumprimento do rácio deve ser atestado por parecer do conselho fiscal, do fiscal único ou do ROC.
Alarga-se o elenco de excepções a que não se aplica o limite (as “sociedades emitentes de acções admitidas à negociação em mercado regulamentado”, as “emissões cujo reembolso seja assegurado por garantias especiais constituídas a favor dos accionistas”, e as “sociedades que apresentem notação de risco da emissão ou do programa da emissão ou da sociedade, neste caso para uma espécie de crédito que inclua as obrigações a emitir …” mantém-se como excepções), acrescentando-se agora os seguintes casos: i) emissões cujo valor nominal unitário seja igual ou superior a EUR 100 000,00, ou o seu contravalor em euros, ou cuja subscrição seja efectuada em lotes mínimos de valor igual ou superior a EUR 100 000,00, ou o seu contravalor em euros; ii) emissões que sejam integralmente subscritas por investidores qualificados, na acepção do Código dos Valores Mobiliários, e desde que as obrigações emitidas não seja, subsequentemente colocadas, directa ou indirectamente, junto de investidores não qualificados.

b) Modalidades (art. 360.º CSC): amplia-se e flexibiliza-se muito o tipo de obrigações que podem ser emitidas, prevendo-se emissão de obrigações que: i) sejam convertíveis em acções ordinárias ou preferenciais, com ou sem direito de voto, ou noutros valores mobiliários emitidos ou detidos pela sociedade emitente (por exemplo, warrants autónomos); ii) confiram direitos de crédito com carácter subordinado; iii) resultem da conversão de outros créditos de sócios ou terceiros sobre a sociedade; iv) apresentem garantias especiais sobre activos ou receitas do património do emitente ou de terceiro. Podem também ser emitidas obrigações que reúnam uma ou mais características das enunciadas, bem como alguma das modalidades previstas anteriormente na lei.

c) Representante comum (art. 357.º CSC): leque de pessoas e entidades que podem ser representantes comuns de obrigacionistas alarga-se.

Luís Graça Moura
Direcção Jurídica
BPI

2. Acções preferenciais sem voto

Recorde-se que, além de direitos patrimoniais especiais, estas acções conferem todos os direitos de natureza patrimonial inerentes às acções ordinárias, com excepção do direito de voto. Quanto àqueles direitos patrimoniais, assinale-se que:

a) Limite mínimo do Dividendo Prioritário: passa a ser 1% do valor nominal, (antes 5%) ou, nas acções sem valor nominal, do seu valor de emissão deduzido de prémio de emissão.

b) Natureza do dividendo prioritário: passam a prever-se 3 modalidades: a geral (titulares de acções preferenciais terão direito a participar na partilha dos lucros distribuíveis da sociedade, consistindo a prioridade no direito de receber o montante que corresponde ao dividendo, previamente aos restantes accionistas), a adicional (estatutos podem prever direito a um dividendo adicional, o qual, além de ser pago com prioridade, acresce aos dividendos a atribuir a cada accionista) e a preclusiva (quando as acções preferenciais só sejam subscritas por investidores qualificados e não sejam admitidas à negociação em mercado regulamentado, estatutos podem prever que as mesmas confiram direito apenas ao dividendo prioritário, não participando do remanescente dos dividendos a atribuir a todas as acções).

c) Pagamento do dividendo prioritário: passa a prever-se, como novo regime geral (aplicável por defeito), que estatutos possam determinar um número de exercícios mais alargado para pagamento dos dividendos, sem que se estabeleça um limite máximo findo o qual estas acções recuperem o direito de voto. Cria-se um novo regime especial: estatutos podem, relativamente a acções só subscritas por investidores qualificados e não admitidas à negociação em mercado regulamentado, i) determinar o regime de pagamento do dividendo; ii) prever que acções se convertam em acções ordinárias quando tal se preveja nas condições de emissão; e iii) prever um número de exercícios sociais diverso, mas não superior a 5, para recuperação do direito de voto por não pagamento integral do dividendo prioritário.

Finalmente, lei passa a admitir expressamente (art. 344.º-A CSC) - o que a doutrina já admitia - a emissão de acções com direito de voto e que, ainda assim, disponham de dividendo prioritário ou com outros direitos especiais, desde que expressamente previstos nos estatutos. Resulta assim claro que os regimes referidos em a), b) e c) (previstos nos arts. 341.º e 342.º CSC) correspondem apenas ao conteúdo mínimo do privilégio patrimonial e ao conteúdo máximo da privação do direito de voto.